domingo, 5 de fevereiro de 2012

Jung- If you can...


"A forma do mundo em que o homem nasceu já está dentro dele como imagem virtual ". (Carl Jung)

Há muitos anos atrás, quando fui na minha primeira psicóloga, a Lúcia, ela me disse: você, se fizer psicologia, vai gostar muito de Jung.
Eu não vi nada de Carl Gustav Jung em toda a faculdade, mas pensava que por ser muito complexo e por compreendê-lo sendo também um psicanalista, decidi estudar primeiro a base da psicanálise, para depois seguir adiante no que não fazia sentido algum para mim.
Minha colega, a Rose, sempre gostou de Jung e me dizia que eu iria gostar, mas eu simplesmente não entendia nada do que lia a respeito e tive, no máximo, algumas tentativas frustradas de folhear alguns livros, sem sucesso.
Após cinco anos tentando apreender o "básico" da psicanálise (que não é nada simples)cheguei a um impasse entre a toria e a prática e a partir de então, tenho estado aberta para enxergar outras perspectivas, que possam complementar a minha práxis.
Ao começar a estudar a teoria Freudiana, senti a necessidade de experimentar, na prática, como isso seria na minha vida e me tornaria mais eu mesma, acredito que há pouco, encerrei um ciclo com meu analista, o que me trouxe uma necessidade de buscar algo além.
Na hora de trabalhar com meus pacientes, eu como terapeuta, senti a necessidade de algo mais e assim, tenho conseguido, paulatinamente, entrar em contato com alguns conceitos do Jung, de forma mais abrangente, com a ajuda da minha amiga, que tem pós em teoria Junguiana e tem me recomendado alguns livros.
Das teorias que tenho visto,o que mais me chama atenção são as diferenças ideológicas dos dois terapeutas em relação à religião e a relação entre consciente- inconsciente.


" Segundo Freud, a religião é uma neurose obsessiva- uma enfermidade psicológica alimentada pela repressão sexual.Para Jung, a ausência, e não a presença, da religião que leva á neurose. " (Michael Palmer)



Não quero defender nenhuma religião, até porque no momento não tenho frequentado nenhuma, mas acredito sim, que a maioria da população tem uma crença religiosa e isso fala muito dessa pessoa, por isso tal característica não pode ser vista como uma patologia, mas como uma das infinitas formas do nosso inconsciente se manifestar e de existirmos no mundo.
A forma como a pessoa lida com o passado, que tipo de Deus ela concebe, como são os rituais com que ela se identifica, quais as fantasias ou teorias sobre o que há depois da morte, falam muito a nosso respeito, ao meu ver.
Não só em relação à religião, mas a todas as manifestações criativas da vida falam sobre quem somos e como nos relacionamos com as coisas ao nosso redor, que segundo Jung se manisfestam sobre forma de arquétipos.
O conceito do arquétipo, de Jung, está na tradição das Idéias Platônicas, presentes nas mentes dos deuses, e que servem como modelos para todas as entidades no reino humano.
As tendências herdadas, armazenadas dentro do inconsciente coletivo, são denominadas *arquétipos e consistem em determinantes inatos da vida mental, que levam indivíduo a comportar-se de modo semelhante aos ancestrais que enfrentaram situações similares. A experiência do arquétipo normalmente se concretiza na forma de emoções associadas aos acontecimentos importantes da vida, tais como o nascimento, a adolescência, o casamento e a morte, ou as reações diante de um perigo externo. Jung referia-se aos arquétipos como as "divindades" do inconsciente.
Quando Jung investigou as criações artísticas e místicas das civilizações antigas, descobriu símbolos de arquétipos comuns, mesmo entre culturas bem distantes no tempo e no espaço, sem nenhum indício de influência direta. Também descobriu o que pensou serem traços desses símbolos nos sonhos relatados pelos pacientes (Noll).
Além desse aspecto, a psicanálise mais ortodoxa, trabalha o tempo todo em torno do trauma original(na prática psicanalítica, pois relaciona os comportamentos inadaptativos do presente com bloqueios inconscientes do passado),o que de certa forma desconsidera um pouco nossa história de conquista pessoal, nosso potencial individual, nossa liberdade, nossa possibilidade de mudar,limitando-nos a seres reducionistas e destinados a sofrer.Somente um psicanalista poderia me libertar das minhas amarras inconscientes!?
Existem vários dogmas dentro da teoria Freudiana, dependendo da perspectiva de cada leitor e isso não seria também uma patologia da teoria, ou uma fragilidade do próprio Freud humano?
A psicologia social e a filosofia, num sentido amplo, demonstram que nosso contato com os outros e como esse contato pode nos transformar ao longo das experiências, o encontro com novos sentimentos e como nossas conquistas e metas atuais também falam sobre que me tornei e posso me tornar.
Na teoria de Sigmund Freud, em termos gerais, o foco está no próprio indivíduo e em como ele enxerga o mundo a partir dele mesmo, ele se mantém fixado em seus estágios anteriores, os quais não pode se desenvolver enquanto não entrar em contato com os conteúdos inconscientes que geraram a tal fixação. Não é explícito que ao entrar em contato com o outro e com novas experiências possa haver mudanças concretas e cognitivas que sejam fruto dele mesmo, pois estaria preso emocionalmente àqueles fatos, como se a partir daquele momento, não pudesse transformar-se mais.
Sartre afirma que o homem é absolutamente livre, além do fato de que se deve sempre agir com responsabilidade no exercício de tal liberdade. Suas opiniões sobre liberdade também aparecem surpreendente para aqueles que estão familiarizados com o fato de que ele defende uma filosofia monista e materialista. No entanto, Sartre resolve esta aparente contradição, argumentando que apesar de vivermos em um universo material em que o nosso destino pode ser pré-determinado, devemos sempre agir como se estivéssemos completamente livre. Ele enfatiza a atitude (fenomenológica existencial) que, como nos encontramos no mundo não há absolutamente nada que nos impeça de agir ou se comportar de qualquer maneira que achar apropriado para a nossa situação individual.
Sartre tem uma visão orientada para o futuro das pessoas e da consciência, como ele aponta que a consciência é sempre consciência de algo fora de si. Pode-se contrastar a visão cartesiana de que "Eu penso, logo existo", com Sartre "Eu acho que alguma coisa". Freud estava mais preocupado com o rastreamento de volta ao passado na tentativa de chegar às raízes (inconsciente) de ações do paciente. Alguém poderia argumentar que a técnica de Freud de livre associação também permitirá que o paciente se relacione seu passado ao seu presente e futuro. O analista certamente não iria parar o paciente quando discutisse o presente eo futuro (o presente e o futuro não são trabalhados diretamente na sessão). Mais uma vez, as suas respectivas técnicas poderiam produzir os mesmos resultados. Uma grande diferença é que o psicanalista existencial tentaria intervir de forma mais freqüente. Ele também poderia ser mais agressivo em sua tentativa de levar o paciente a aceitar a responsabilidade por suas ações (Van Deurzen-Smith).
Salienta também, que era necessário focar intensamente o sujeito individual. Ele argumenta que foi necessário estudar e tentar entender: "... O que é individual e muitas vezes até mesmo instantâneo. O método que serviu para um assunto não será necessariamente adequado a ser usado para outro assunto, ou para o mesmo assunto em um período posterior ".
A consciência da escolha de si mesmo é a relação concreta com a existência,com o projeto de si mesmo em sua totalidade e com o significado do existente. Com isto, pode-se dizer que, a escolha implica uma determinada interpretação do mundo e de si mesmo, uma interpretação marcada pela intencionalidade consciente do ser e fazer dos sujeitos.
Tais conceitos, na idéia marxista, por exemplo, compõem uma das fases do processo dialético que trata da questão da alienação, equivalente à inautenticidade nos pressupostos filosóficos existencialistas (Ferrater Mora). A inautenticidade é o ocultar-se, o auto-engano, o não se reconhecer, a impossibilidade do distanciamento e da utilização da liberdade para não ser alienação.


"A análise da condição humana aparece permeada pela busca da transcendentalidade da consciência, que só pode ocorrer desde o para-si como ser-para-outro" (Sartre). 

 
De acordo com Sérgio Pereira Alves, a individuação (um dos conceitos centrais de Jung) significa fazer-se indivíduo, o que para  mim, está muito próximo ao termo de sartre, quando usa " a escolha de si mesmo". Alcançar o máximo de sua individualidade, a qual podemos entender como a mais íntima e profunda expressão de nosso ser, com uma total compreensão, aceitação e permissão desta expressão. E ainda reconhecer a ação de um material inconsciente sobre o eu. Estas três atitudes citadas acima praticamente definem o termo de responsabilidade que deveríamos ter em relação ao nosso crescimento interno. Isto seria reconhecer-se tal como se é, por natureza, e não como se gostaria de ser. Individuar-se é ser um com o todo, consigo mesmo. É não existir lá, não existir divisões. É não existir o outro, é não ver o caminho fora de si mesmo. É ser um com o caminho. Só assim o caminho existirá sob os seus pés.
Citei  sartre e Jung, como comparação a Freud, pois percebo que há mais ênfase , em suas teorias e "prática", na capacidade inata de cada um, de ser um construtor mais ativo da sua realidade psíquica, dentro e fora do setting terapêutico, numa relação dinâmica - passado, presente, futuro- eu e os outros.
Em Freud, nos atemos às causas, em Jung nós nos deparamos com o aspecto prospectivo da individuação, de forma mais autônoma. Uma natureza intencional do dinamismo psíquico para a auto-realização, para o equilíbrio. Uma orientação mais voltada para fins ou propósitos do que causas.
A maioria dos cientistas mais radicais são reducionistas e pragmáticos e vivem com a ilusão de que obteram a verdade e têm a pretensão de que, ao darem significado e explicação às coisas, terão o poder sobre elas, mas existem fatos que simplesmente não temos respostas e o próprio Freud, ao trazer o conceito de inconsciente falava isso, do não-domínio da própria mente; e por que não dos fatos? Nunca vamos nos apropriar de tudo, não há cura para a mente, para o pensar, para o existir, pois a todo momento estamos em transformação.
Na autocrítica ao seu apolitismo, Sartre conduz seus escritos para a implicação da escolha como exercício da liberdade comprometida temporal, histórica e socialmente. Por isso, sua compreensão é de uma liberdade construída no âmago do exercício sócio-histórico, marcada pela intencionalidade de suas escolhas. Este entendimento é resgatado na noção de projeto, ou seja, da liberdade para o fazer (Gómez-Müller), justificando, assim, as raízes do estar-no mundo pela ação e pelo sentido comprometido da vida humana, engajada em suaspossibilidades de autenticidade.


"O passado é um fato puro, não modificável, que exerce uma função restritiva sobre a liberdade, porém seu sentido depende do meu futuro. Ao incorporar o passado ao projeto, este se converte em situação. São estas as referências manifestadas nas análises do passado, presente e futuro e sua estruturação no definir a vida humana pelos seus atos e fatos (Sartre)."


A psicologia- teórica e prática- deve ser ampla, como vasta é a imensidão da nossa mente, dos nossos pensamentos, do nosso querer consciente, do nosso fazer sem querer e do nosso existir, seja lá como for.
A vida, a mente e as emoções estão em constante processo de mudança, a trasformação está acontecendo a todo instante.


"Não se pode percorrer duas vezes o mesmo rio e não se pode tocar duas vezes uma substância mortal no mesmo estado; por causa da impetuosidade e da velocidade da mutação, esta se dispersa e se recolhe, vem e vai." (Heraclito de Éfeso)


Nesta nova jornada pela tentativa de ingressar um pouco além da mente humana, encorajo-me a entrar nos campos das incertezas de Jung.



"Não me venham com conclusões! A única conclusão é morrer."(Fernando Pessoa)

terça-feira, 17 de janeiro de 2012

Torna-te mais!


Bendito quem inventou o belo truque do calendário, pois o bom da segunda-feira, do dia 1º do mês e de cada ano novo é que nos dão a impressão de que a vida não continua, mas apenas recomeça...

Mário Quintana

Hoje não estou inspirada, não porque me falte o que escrever, mas porque estou em um momento de reconstrução.
Quando eu era pequena me ensinaram que não se muda de idéia e tenho aprendido que a melhor coisa da vida é mudar de idéia, mudar quem se é, quando não está dando certo.
Se resolvemos mudar o caminho que estávamos seguindo é porque aquele caminho, daquela maneira, chegou ao fim.
Dá um alívio e uma dor quando algo chega ao fim. Temos alívio porque acabou e temos dor pela ausência do que tínhamos, que de alguma forma nos enchia.
Só que nesse saco de coisas que vamos colocando na nossa vida, muitas das coisas que carregamos e mantemos são só bugigangas.
Abrir-se para o novo é de certa forma, perder o que já se tem.
O fim não precisa ser uma término, pode ser um recomeço.
Um recomeço pode ser com as mesmas pessoas, mas também pode ser em um cenário novo, com novos atores.
Somos tão apegados e queremos que as coisas não mudem nunca mais e ficamos presos ao que não precisamos.
Ficamos presos a pessoas, a idéias, a um momento feliz do passado, a um comportamento que não nos acrescenta em nada...
Mudar de idéia, mudar de rumo é para aqueles que não se acodmodam e que se dominam, que escolhem, são livres.
Querer mais não é só para os insaciáveis, para os teimosos.
Quando somos pequenos, nossa família, nossos colegas, nossos amigos vão nos dizendo tudo que pensam e as pessoas que mais gostamos nos deixam marcas gravadas.
Acreditamos que elas são nossas, mas nem questionamos quando crescemos, se aquelas idéias e aquela maneira de ser fazem sentido para nós, elas apenas estão lá.
Existem pessoas que dizem:sou assim. Não vou mudar.(Como assim?Deveríamos mudar sempre sim!)
Começamos a trabalhar e aprendemos técnicas, passamos a usar as teorias na prática e não questionamos, não pensamos em mudar, em evoluir, mas em repetir.
Vamos a uma religião e nos encontramos, chega um ponto que estamos de novo tentando nos enquadrar, pois não vamos nunca nos adequar plenamente no ideal de um outro, fomos feitos para seguir nosso próprios.
Como se houvesse um lugar pré-definido para cada um e um limite para que a gente se expanda.
O limite é dado por nós!
Acreditamos que o que os outros inventam tem valor, mas que nossas potencialidades são restritas.
Nos tornamos máquinas, que repetem, que buscam fazer perfeitamente o que alguém inventou e que muitas vezes nem ouve mais o coração.
Foi descoberto que o coração é parecido com o cérebro, que também sente, pensa, o que todos nós sabíamos- porque dá um aperto nele quando está tudo doendo e porque ele explode batendo quando somos felizes.
No entanto, temos que conviver com conceitos limitados que não englobam a grandeza do que somos, pois pouco se sabe sobre nossa mente e nosso coração (afetivamente falando).
Se não é comprovado não tem valor, mesmo que eu sinta diferente.
Temos padrões mentais, coisas que já tomamos como nossa forma de pensar e usamos eles para todas as nossas decisões, como um local onde guardamos nosso valores, desejos e sonhos. Pode ser uma caixinha preta que guardamos há muito tempo num armário, bem no fundo.
Quando precisamos decidir algo, vamos lá e damos uma olhadinha nessa caixa.
Será que essa caixa ainda combina com quem somos hoje?
Será que o que guardamos na caixa nos faz bem?
Será que a caixinha preta está dando certo?
Fomos feitos para mudar, para pensar, mas será que muitas vezes não andamos como cavalos encilhados?

Recomeça... se puderes, sem angústia e sem pressa e os passos que deres, nesse caminho duro do futuro, dá-os em liberdade, enquanto não alcances não descanses, de nenhum fruto queiras só metade.

Miguel Torga

Se desestruturamos as questões mais centrais da nossa vida nos perdemos e precisamos começar tudo de novo, que complicado.
Pensar diferente, ser diferente, viver diferente, agir diferente.
Dar chance ao novo.
Tem momentos em que a vida nos cerca de todos os lados e alcançamos só dor, seja qual for a estrada que escolhemos.
Quando chega nesse ponto é porque essa trilha, esses pensamentos e essa forma de ser está errada.
Simplesmente é uma escolha errada.
Todas as escolhas são nossa responsabilidade.
Precisamos dar a volta, fazer o contorno, analisar tudo e pegar outra estrada.
Na vida, existem uma série de estradas que surgem a cada dia, a cada tempo, umas mais difíceis de chegar, outras mais longas de percorrer...
O caminho mais certo é voltar-se pra dentro.
Quando nos sentimos seguros podemos perceber que a segurança é o que está nos matando, pois a vida é cheia de incertezas, medos e recomeços, somos seres dinâmicos e quando negamos a impermnência das coisas com uma falsa sensação de controle, nos perdemos.

A cada nascer do sol há um novo começo e podemos escolher fazer tudo de outra maneira...



Você me pergunta: que que eu faço? Não faça, eu digo. Não faça nada, fazendo tudo, acordando todo dia, passando café, arrumando a cama, dando uma volta na quadra, ouvindo um som, alimentando a Pobre. Você tá ansioso e isso é muito pouco religioso. Pasme: acho que você é muito pouco religioso. Mesmo. Você deixou de queimar fumo e foi procurar Deus. Que é isso? Tá substituindo a maconha por Jesusinho? Zézim, vou te falar um lugar-comum desprezível, agora, lá vai: você não vai encontrar caminho nenhum fora de você. E você sabe disso. O caminho é in, não off. Você não vai encontrá-lo em Deus nem na maconha, nem mudando para Nova York, nem.

Caio Fernando Abreu